No mundo digital, onde marcas disputam atenção e conexões se constroem em tempo real, a empreendedora e influenciadora Lela Brandão navega com naturalidade. Antes mesmo de anunciar uma nova coleção, suas redes já dão pistas do que está por vir. Uma camiseta surge casualmente em seus stories, seguidores atentos perguntam onde comprar, e as mensagens são enviadas diretamente para o canal de WhatsApp da marca. No dia seguinte, uma contagem regressiva aparece no feed. Depois, um cupom especial é revelado no episódio do podcast. O que para muitos parecia uma estratégia meticulosamente planejada, para Lela é apenas a maneira natural de fazer negócios.
Mais do que empresária, ela é comunicadora – e faz dessas duas facetas um diferencial poderoso. “Para qualquer um dos projetos que eu participo, eu estou sempre olhando os negócios do ponto de vista da comunicação. Ou seja: qual é a mensagem? Como podemos contar essa história do melhor jeito possível? Meus canais como influenciadora são, também, um asset para esses projetos, ou seja, um canal de mídia gratuito, com acesso direto e orgânico a um público extremamente qualificado”, explica.
Dona de uma visão afiada sobre branding e engajamento, Lela construiu um modelo de negócio que transcende o tradicional. Suas empresas não apenas vendem produtos, mas contam histórias – e o público, fiel e atento, faz parte dessa narrativa. Afinal, antes de tudo, veio o trabalho como comunicadora.
Da comunicação à construção de marca
Para Lela Brandão, a conexão com sua comunidade sempre foi o ponto de partida. Há mais de uma década, ela nutre e amplia essa rede nas plataformas sociais. Parte desse papel é ouvir atentamente seus seguidores – ou melhor, sua comunidade, já que a palavra “seguidores” nunca a agradou.
Foi esse diálogo constante que surgiu, quase sem intenção, a primeira experiência com produtos físicos. Em 2019, Lela e sua audiência testaram algumas peças de forma despretensiosa. O resultado? Um interesse genuíno e espontâneo por algo além do digital. “Ali, pudemos validar o interesse da minha comunidade em produtos físicos”, conta.
A partir dessa resposta positiva, o sonho ganhou forma. No final de 2020, em meio à pandemia, nasceu a Lela Brandão Co.. “Investimos em uma marca mais robusta e sólida, inspirados pelo meu sonho de poder ter um armário que respeitasse o meu corpo, com roupas exclusivamente confortáveis e estilosas”, relembra.
Mas sua inquietação criativa não parou por aí. Três anos depois, em 2023, Lela lançou o podcast Gostosas Também Choram, um espaço para conversas mais profundas e sem pressa. Ela buscava um formato em que não precisasse fazer malabarismos para convencer o espectador a ficar mais de 15 segundos. Seja com roupas ou palavras, Lela vê cada projeto como uma extensão do mesmo propósito: se comunicar e se conectar.
“Todos os projetos vieram da minha vontade de me comunicar e conectar com pessoas a partir das minhas reflexões e questionamentos, a diferença é que alguns produtos são palpáveis e outros são mais etéreos”, brinca.
Conexão profunda

Para Lela Brandão, as redes sociais são muito mais do que um espaço de exposição: elas funcionam como verdadeiros canais de mídia para os projetos em que estão envolvidos. E essa dinâmica faz toda a diferença.
“Nenhum deles teria verba suficiente para contratar uma influenciadora do meu tamanho de início, já que todos são independentes, e por isso acredito que essa junção de fundadora, diretora criativa e influenciadora é um grande diferencial”, conta. Ela relembra que, ao iniciar a marca, seus números eram bem menores.
Porém, os projetos se retroalimentam entre si, e a comunidade pode participar do seu universo a partir de vários pontos de contato simultaneamente, o que torna a experiência mais imersiva e próxima. “É diferente você seguir uma pessoa nas redes sociais e curtir um post dela de vez em quando, do que ter um produto que ela criou, ou escutar ela falando por uma hora toda semana, poder entrar em um espaço físico que ela criou (nossa loja física, por exemplo). A conexão é outra”, completa.
Esse envolvimento profundo exige tempo e dedicação, o que levanta a questão do equilíbrio. Mas, depois de anos tentando encontrá-lo, Lela descobriu que talvez ele não existisse. “Hoje, prefiro pensar em estratégia em vez de equilíbrio”, afirma. Para ela, o segredo está em olhar com honestidade para cada projeto, confirmando que sua vida pessoal também faz parte desse ecossistema.
Essa mudança de perspectiva se tornou especialmente evidente durante a escrita de seu primeiro livro. “Passei meses tentando encaixar a escrita na minha rotina, no tempo que dava. Quando fomos honestos e olhamos para o livro não como um projetinho pessoal, mas sim como mais um ponto de contato que vai beneficiar todos os projetos que eu participo, pudemos traçar estratégias na minha agenda para que eu conseguisse imergir na escrita do jeito que o livro precisa”, conta.
Além disso, ela comenta que o projeto do livro tem ocupado boa parte do seu tempo. Ao mesmo tempo, é algo que tem feito seus olhos brilharem bastante. “Gosto muito da ideia de poder me conectar com as pessoas por diferentes pontos de contato: roupas, conteúdo, áudio, ao vivo… E agora, através da leitura também. Estou igualmente animada e apavorada – meu estado de espírito preferido”, pontua.
Equilíbrio vs. Estratégia
Construir um negócio do zero, sem grandes investimentos, exigiu da empresária muito mais do que criatividade. Foi preciso desenvolver habilidades que ela nem imaginava precisar. Na Lela Brandão Co., foram papéis essenciais para o funcionamento da marca. Afinal, no começo, não havia verba suficiente para contratar toda a equipe necessária.
“Ainda faço isso bastante, mas muito, muito menos do que no início. Quando começamos a marca éramos eu, o Viktor Murer (cofundador) e a Barbarah, nossa amiga que convencemos a trabalhar com a gente. Hoje, claro, a equipe é muito maior e mais robusta, mas ainda participo mais da execução do que deveria. Estou trabalhando nisso para que eu possa dedicar meu tempo e energia cada vez mais para as partes em que sou indispensável, como comunicação e direção criativa”, conta.
Hoje, com uma agenda dividida entre sua marca, o podcast e as parcerias publicitárias, Lela precisou encontrar uma estratégia para manter o foco sem abrir mão da criatividade. A solução veio há alguns anos, e desde então ela não abre mão: “blocar” as atividades.
“Minha agenda tem dias e horários específicos para cada uma das demandas, por exemplo: na segunda-feira, eu me dedico exclusivamente ao time de marketing da marca; às tardes de terça-feira, faço roteiros e peças escritas que precisem da minha atenção; quarta-feira à tarde é dedicada para gravar o podcast, e assim vai. Outra coisa que me ajuda muito é manter as reuniões e pendências sempre de manhã, para que eu possa entrar em um período mais imersivo na parte da tarde. Sinto que o trabalho criativo se beneficia muito disso”, destaca.
Urgente vs. Importante
Em 2024, Lela deu mais um passo na busca por equilíbrio ao investir em uma consultoria estratégica. Para ela, tem sido muito importante implementar novas ferramentas e ideias ao longo do tempo de sua dinâmica.
“Um grande desafio é manejar minha rotina com todos os envolvidos, inclusive meus clientes de publicidade (marcas e agências) que quase sempre têm prazos bem apertados. Isso significa muitas vezes dizer não para oportunidades incríveis, mas faz parte. O importante é sempre olhar o contexto maior e a longo prazo”, reforça.
Com múltiplos projetos acontecendo simultaneamente, a empresária precisou desenvolver um método para não se perder no caos do dia a dia. A chave para isso, segundo ela, foi a clareza e a honestidade na hora de olhar para as próprias demandas. “Aprendi a importância de separar o que é urgente do que é importante e não perder nenhum dos dois de perspectiva”, explica. “Quando você tem muitas demandas, vindas de times e projetos diferentes, a inércia te leva a passar o dia respondendo mensagens urgentes e apagando fogo de todos os lados. Mas nenhum negócio evolui dessa forma”.
Na teoria, a ideia é enxergar isso e buscar fluir entre o que é urgente e importante. Na prática, significou desligar as notificações do celular, conversar com as equipes para que liguem em casos de urgência, e determinar horários precisos para responder e-mails e mensagens. “Consigo perceber o quanto isso fez diferença para mim, por realmente poder mergulhar nos processos criativos e conseguir sentir prazer nisso. Como isso, frequentemente, significa também melhores resultados, vejo como tem feito também diferença para os projetos”, frisa.
Visão sobre empreendedorismo

Lela sempre teve uma visão clara sobre o que queria construir, mas só quando se tornou empreendedora que começou a entender, de fato, o que o sucesso realmente significava. “Pode soar clichê, mas eu só entendi que o sucesso não é uma linha de chegada, que não existe ‘chegar lá’ depois de empreender, especificamente com a Lela Brandão Co.”, reflete.
Estar à frente de um negócio fez com que enxergasse a jornada de outra maneira. Em outras palavras, a forçou a procurar as peças do quebra-cabeça do sucesso, que antes, eram um ponto. Hoje, ela entende mais como uma linha em constante estado de manutenção.
“Nesse tempo empreendendo, já descobri onde não mora o sucesso, mas ainda estou descobrindo onde ele mora. Até agora, suspeito que está em poder contribuir com o mundo do seu jeito realmente autêntico, com aquilo que só você pode fazer, de uma forma que resulte em uma junção de abundância, curiosidade contínua e prazer no caminho”, relata.
Para aqueles que desejam empreender – seja com um negócio, um projeto criativo ou uma carreira como influenciador –, Lela tem um conselho direto: observe a realidade antes de mergulhar de cabeça. Além disso, é importante pedir para acompanhar alguém que empreende na área que você quer, para entender como é o dia a dia do negócio que pretende seguir.
Mais do que ter, ser
Para ela, muitas vezes, o desejo de “ter algo” – uma marca, um podcast, milhares de seguidores – ofusca o que isso realmente exige no cotidiano. “Esquecemos que isso significa também ‘ser algo’ diariamente, e isso essa parte vai ocupar um espaço muito maior da sua vida do que ‘ter’”, aconselha.
Lela relembra ter sentido isso na pele ao fundar sua marca de roupas. Ela imaginava o site, as coleções, queria criar roupas. Porém, não passou pela sua cabeça que precisaria aprender sobre ERPs, ROI, CAC, plataformas, gestão de equipe, CRM, logística… Nada disso. “Mas para ter uma marca de roupas, eu tive que ser várias coisas que ela precisava que eu fosse”, diz. O mesmo acontece no universo da influência digital. Para ela, é um trabalho muito privilegiado, mas vem junto com o custo da exposição da sua imagem.
Para Lela, empreender é uma jornada intensa, imprevisível e cheia de aprendizado. Mas é também um caminho sem atalhos. “Meu conselho é: veja com os seus próprios olhos, observando alguém que já faz isso no dia a dia, para poder decidir com propriedade no que você está se metendo. É recompensador, claro, mas tem um custo”, finaliza.
*Fotos: Assessoria
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