A importância de Dona Ivone Lara para a música popular brasileira

Dona Ivone Lara foi muito mais do que uma grande cantora e compositora: ela foi um símbolo de resistência, talento e inovação na música popular brasileira. Primeira mulher a integrar a ala de compositores de uma escola de samba e a assinar um samba-enredo, abriu caminho para gerações de mulheres no samba e se tornou conhecida como a Rainha do Samba e a Grande Dama do Samba.

Hoje, dia 13 de abril, seria aniversário da Grande Dama do Samba e nós relembraremos a importância de Dona Ivone Lara para a música popular brasileira.

Uma vida dedicada ao samba e à cultura popular

Nascida em 13 de abril de 1921, no Rio de Janeiro, Yvonne Lara da Costa cresceu cercada pela música. Sua mãe era cantora do Rancho Flor do Abacate, e seu pai, violonista e integrante do Bloco dos Africanos

Desde pequena, conviveu com grandes nomes do choro e do samba, como Pixinguinha e Donga, e aos 12 anos compôs seu primeiro samba de partido-alto, “Tiê-Tiê”, inspirado em um pássaro que ganhou dos primos, Mestre Fuleiro e Tio Hélio.

Mesmo tendo uma inclinação natural para a música, Dona Ivone Lara seguiu um caminho profissional incomum para mulheres negras na época: formou-se enfermeira e assistente social, especializando-se em terapia ocupacional. 

Trabalhou ao lado da renomada doutora Nise da Silveira, revolucionando o tratamento psiquiátrico no Brasil, ao introduzir a música como ferramenta terapêutica. Criou oficinas musicais e ajudou na fundação do bloco Loucura Suburbana, ainda ativo. Seu trabalho humanizou o atendimento a pacientes psiquiátricos, resgatando sua dignidade por meio da arte.

Dona Ivone no hospital no Engenho de Dentro — Foto: Reprodução/Acervo da família

Rompendo barreiras no samba

Na década de 1940, Dona Ivone Lara começou a compor sambas para a escola de samba Prazer da Serrinha. Mas, devido ao machismo da época, suas composições eram apresentadas como se fossem de seu primo, Mestre Fuleiro, para que fossem aceitas. 

Em 1947, casou-se com Oscar Costa, filho do presidente da escola, e aprimorou sua musicalidade ao lado de nomes como Aniceto, Mano Décio da Viola e Silas de Oliveira.

Mesmo com todo o preconceito enfrentado, sua paixão pela música e sua habilidade com melodias sofisticadas chamavam a atenção. Seu talento foi finalmente reconhecido em 1965, quando se tornou a primeira mulher a integrar a Ala de Compositores do Império Serrano. 

Foi co-autora do clássico samba-enredo “Os Cinco Bailes da Corte”,  ao lado de Silas de Oliveira e Bacalhau – que marcou a história do carnaval carioca. Três anos depois, foi homenageada como madrinha da ala e passou a desfilar na Ala das Baianas, consolidando-se como um nome de peso no mundo do samba.

O reconhecimento nacional e o sucesso musical

A carreira como cantora começou de fato na década de 1970, quando participou do disco “Sargentelli e o Sambão” e do show “Sambão”, ao lado de Clementina de Jesus e Roberto Ribeiro. Foi nessa época que adotou o nome Dona Ivone Lara, compreendendo que o “Dona” era uma afirmação de sua grandeza e importância na música brasileira.

Em 1977, depois de mais de 30 anos, Dona Ivone Lara se aposentou do hospital, passando a se dedicar, exclusivamente, à carreira artística. Nessa época, suas músicas passaram a ser gravadas por diversos artistas da música popular brasileira, como: Clara Nunes, Maria Bethânia, Gal Costa, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Paulinho da Viola, Martinho da Vila, Zeca Pagodinho e Beth Carvalho.

Em 1978, ela lançou seu primeiro disco solo, “Samba Minha Verdade, Samba Minha Raiz”, que trouxe sucessos como “Samba Minha Raiz” e “Espelho da Vida”  (parcerias com Délcio Carvalho).

No mesmo ano, Maria Bethânia e Gal Costa eternizaram “Sonho Meu”, uma de suas composições mais icônicas, também em parceria com Délcio Carvalho.

Outros clássicos de sua carreira são:

  • Alguém Me Avisou
  • Acreditar (com Délcio Carvalho)
  • Tendência (com Jorge Aragão)
  • Enredo do Meu Samba (com Jorge Aragão)

Suas composições misturavam lirismo e um olhar atento à vida e às lutas do povo negro, trazendo uma perspectiva única ao samba.

A década de 1980 consolidou Dona Ivone Lara como uma das maiores compositoras da música brasileira. Ela lançou álbuns aclamados como “Sorriso Negro” (1981) e “Alegria da Minha Gente” (1982), trazendo sucessos que ainda hoje fazem parte do repertório de intérpretes renomados. 

Suas composições foram gravadas por Clara Nunes, Paulinho da Viola, Martinho da Vila, Zeca Pagodinho e Beth Carvalho, além de artistas mais recentes como Marisa Monte, Roberta Sá e Criolo.

Legado Incomparável

Dona Ivone Lara dedicou sua vida ao samba e à cultura popular, sendo um verdadeiro patrimônio imaterial do Brasil. Seu talento para criar melodias refinadas e letras que expressavam as alegrias e desafios do povo negro a tornaram uma referência incontestável. Como mulher negra em um espaço historicamente masculino, ela rompeu barreiras e abriu portas para futuras gerações de sambistas.

Ela dizia: “Me sinto feliz da vida quando a inspiração chega. Vem a melodia e começo a cantarolar. Quando ela vem, ela fica, não esqueço de jeito nenhum.”

Em 2018, aos 97 anos, Dona Ivone Lara nos deixou, mas sua música permanece viva. 

Suas composições continuam a ecoar, reafirmando sua importância na história do samba e da música popular brasileira. Seu legado é eterno, assim como a emoção que suas canções despertam em cada nova geração que as descobre. Seu nome está para sempre gravado na história do Brasil, com acordes que seguem embalando a cultura e o coração do povo.

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