Da série de homenageados ilustres que tornaram ainda mais especial a festa de 30 anos da Consumidor Moderno, no Allianz Park (SP), subiu ao palco Michel Alcoforado – antropólogo, fundador do Grupo Consumoteca e eterno curioso, sempre em busca de respostas para a pergunta “por quê”.
Com uma alegria contagiante e irreverência que desafia o senso comum, o mestre em desvendar as complexidades do comportamento humano e traduzi-las em insights valiosos para empresas e profissionais do setor de CX foi enfático: “Não há como fazer marketing sem antropologia, e é bom que gestores saibam disso. Do contrário, suas empresas cairão no esquecimento”.
O especialista citou Philip Kotler, considerado um dos maiores nomes do marketing no mundo, para respaldar a máxima. “Desde Kotler, a gente acredita que marketing nada mais é do que um caminho para atender as necessidades e desejos dos consumidores – não tem como dar conta de necessidades e desejos de ninguém sem saber como a antropologia pode nos ajudar a fazer isso. Então, eu diria que quem não sabe, está atrasado”, reforçou.

Desvendando o inconsciente do consumo
O ponto alto da carreira de Michel Alcoforado se deu quando ele entendeu que “as pessoas não sabem o que querem na hora em que estão no ponto de venda porque, no momento em que estão comprando, são guiadas pela cultura”.
A descoberta, que marcou sua virada para a antropologia do consumo, desafia a visão tradicional de que os consumidores são racionais e conscientes de suas escolhas.
“Não adianta você perguntar para a pessoa: ‘e aí, fulano, você gosta dessa camisa de tal jeito ou de outro? Você gosta dessa garrafa de tal jeito ou de outro?’, porque a cultura não deixa a gente pensar, ela apenas dá o comando para você fazer”, explica.
A constatação desse comportamento instigou o especialista a investigar os “porquês” por trás das decisões de compra e ao descobrir que as motivações estão para além do discurso – nas camadas mais profundas da cultura e do inconsciente coletivo – ele falou: “É isso o que eu quero fazer!”.
Para Alcoforado, as marcas que se destacam são aquelas que conseguem entregar aos clientes o que eles querem, mesmo que eles não saibam o que é.
“A grande transformação é estarmos aqui achando que sabemos o que estamos fazendo, mas ninguém sabe”, disse Michel, convidando as empresas a se conectarem com seus consumidores de forma mais autêntica e profunda.
A era da conversa
Na avaliação do antropólogo, a digitalização é a “grande força transformadora do consumo na atualidade”, mas não se resume apenas à compra online. Por isso, ele destaca o potencial da “conversa” como característica essencial para as marcas que buscam fidelizar o consumidor.
“A grande tendência que vai marcar os próximos anos é como o valor de conversa se transforma muitas vezes em atributo mais importante do que o produto que a gente está entregando”, explica.
Ele avalia que, no novo cenário, o que as pessoas falam sobre o que compram se torna tão importante quanto o produto ou serviço em si.
“As marcas que souberem criar produtos e experiências que gerem conversas positivas e engajamento terão um diferencial competitivo importante”, complementa.
Marketing pelo consumidor, não pelo produto
Para Michel Alcoforado, o futuro do marketing passa, necessariamente, por uma mudança de mindset nas empresas. “Eu acho que o caminho importante é a gente verdadeiramente colocar o consumidor no centro da tomada de decisão”, defende.
No entanto, ele reconhece que essa não é uma tarefa fácil. “Boa parte das vezes, na correria das grandes empresas, se vê mais discurso do que prática”, lamenta.
Nessa perspectiva, o especialista defende a presença de profissionais que entendam de consumidores em todos os níveis das organizações – do conselho administrativo até os fóruns de liderança.
“A gente precisa ter no conselho alguém que entenda de consumidor. Nos grandes fóruns da autoliderança das grandes companhias, a mesma coisa”, enfatiza. Somente assim, será possível garantir que as decisões da empresa estejam alinhadas com as necessidades e desejos de seus clientes”, avalia.
O legado de Michel Alcoforado é um chamado para que as empresas abandonem o marketing centrado no produto e adotem uma abordagem verdadeiramente focada nos clientes.
“Ao colocar o consumidor no centro das decisões, as empresas estarão não apenas construindo marcas mais fortes e relevantes, mas também contribuindo para um mundo mais justo e conectado”, conclui.


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