Os caminhos que cruzam o julgamento de Bolsonaro e as eleições de 2026

Jair Bolsonaro (PL) se tornou réu, ao lado de sete aliados, por uma tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2026. O acolhimento das denúncias contra ele pelo STF (Supremo Tribunal Federal) altera a condição jurídica do político, mas também sua estatura e poder de influência nas eleições de 2026, tanto para aliados quanto para adversários na corrida.

O ex-presidente considera que o processo criminal foi aberto com o objetivo de tirá-lo das urnas. “Querem impedir que eu chegue livre às eleições porque sabem que, numa disputa justa, não há candidato capaz de me vencer”, disse após o julgamento.

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Em busca de sustentação

Bolsonaro já está inelegível e, portanto, fora da corrida até 2030 por decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), que o condenou por cometer abuso de poder econômico e político na campanha eleitoral de 2022, mas ainda confiava na recuperação dos direitos políticos por meio do Legislativo, com um projeto de anistia. Horas após tornar-se réu, ele voltou a dizer que, para 2026, há três opções: “Jair, Messias e Bolsonaro”.

As possibilidades de uma eventual anistia diminuem [com a abertura do processo], abrindo espaço para que outras lideranças da direita ganhem espaço. Acontece que o ex-presidente restringe essas brechas, não apenas por estratégia eleitoral, mas porque não confia na divisão de poder com os aliados”, disse à IstoÉ Karolina Roeder, cientista política e professora da Uninter-PR.

Enquanto o principal nome da direita radical se esquiva dos problemas com a Justiça e mantém a bandeira fincada para a próxima corrida ao Palácio do Planalto, outros nomes de seu campo e do oposto utilizam as decisões do STF para fazer seus próprios movimentos, sempre com 2026 no radar.

Olho no lance

Escolhido por Bolsonaro para acompanhá-lo em importantes aparições públicas e apontado por aliados como sucessor natural do ex-presidente, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), saiu em defesa do ex-chefe.

“Sabemos que esse não é o primeiro e não será o último desafio a ser enfrentado, mas sabemos também que a verdade prevalecerá e sua inocência será comprovada. Estou certo de que Bolsonaro conduzirá esse processo com a coragem que sempre motivou todos ao seu redor. Siga contando comigo e com os milhões de brasileiros que estão ao seu lado”, escreveu no X (antigo Twitter). Na segunda-feira, 24, Tarcísio prometeu testemunhar a favor do aliado no Supremo.

Com declarações do tipo, o governador demonstra fidelidade a Bolsonaro para evitar seguir o caminho de exemplos conhecidos. Nas eleições de 2022, enquanto se elegia com apoio do ex-chefe, bolsonaristas arrependidos como os ex-deputados Joice Hasselmann (Podemos) e Alexandre Frota (PDT) não renovaram seus mandatos, e o ex-governador João Doria (PSDB) desembarcava do Palácio dos Bandeirantes com uma candidatura frustrada à Presidência da República na bagagem.

Para Tarcísio, “soltar a mão” do antigo chefe oferece mais riscos ao seu futuro político do que tardar a lançar o nome na praça para o Planalto. “O governador esteve em manifestações contrárias ao STF, não condenou os atos criminosos do 8 de janeiro e evita criticar o ex-presidente. Isso acontece porque ele precisa de Bolsonaro até para uma recondução ao cargo que ocupa”, disse Lilian Sendretti, cientista política e pesquisadora do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), à IstoÉ.

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Tarcísio de Freitas abraça Bolsonaro: governador de São Paulo não tardou a defender aliado após acolhimento de denúncias pelo STF

Em agendas públicas na quarta-feira, os governadores do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), e de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), foram mais amenos do que o chefe do Executivo paulista, mas evitaram apunhalar o ex-presidente.

O goiano defendeu que Bolsonaro tenha “garantido todo o trâmite legal, com direito à apresentação de testemunhas e ampla defesa”, enquanto o paranaense disse que o julgamento deveria ocorrer no plenário do Supremo — o processo ficou nas mãos da Primeira Turma da corte, integrada por cinco ministros conhecidos por posicionamentos firmes quanto aos inquéritos da trama golpista.

Ao contrário de Tarcísio, a dupla ainda “corre por fora” em pesquisas nacionais para 2026, e adota posicionamentos distintos quanto à candidatura. Caiado diz que concorrerá, independentemente do desejo de Bolsonaro, faz críticas públicas ao ex-presidente e travou uma disputa contra ele em Goiás nas eleições municipais de 2024. Ratinho é menos verborrágico e, embora não abrace por completo a “cartilha” do bolsonarismo, faz deferências ao político do PL. No geral, quem o coloca na corrida é Gilberto Kassab, presidente de seu partido.

“Para os nomes alternativos, a estratégia é não atrelar suas próprias imagens a Bolsonaro e, ao mesmo tempo, evitar desagradar sua base de apoio. Ficar ‘em cima do muro’ é mais salutar para eles, do ponto de vista eleitoral“, afirmou a professora da Uninter.

Outros concorrentes ao espólio de Bolsonaro, o ex-coach Pablo Marçal (PRTB), terceiro colocado na disputa pela prefeitura de São Paulo em 2024, e o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), não se pronunciaram sobre o julgamento.

Um a menos

Na raia governista, o presidente Lula (PT) até falou pelo respeito aos ritos do processo, mas enfatizou ser “visível que o ex-presidente tentou dar um golpe no país e contribuir para o meu assassinato, para o assassinato do vice-presidente, para o assassinato do ex-presidente da Justiça Eleitoral brasileira“.

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Lula: presidente dobra aposta na associação de Jair Bolsonaro com extremismo e ruptura institucional

Desde que derrotou Bolsonaro nas urnas, em 2022, o petista busca associar o oponente e seu grupo político a posturas de extremismo e ruptura institucional, narrativa que foi reforçada na ampla reação aos atos criminosos de 8 de janeiro de 2023 e ganha novo fôlego com a abertura do processo criminal sobre a trama golpista.

Explorando a narrativa, figuras centrais do governo, como a ministra Gleisi Hoffmann, da Secretaria de Relações Institucionais, celebraram o julgamento e reforçaram o argumento de que ele correu de forma legal, opondo-se à hipótese de parcialidade do Judiciário. “É muito significativo que esta decisão tenha sido tomada à luz dos fatos apresentados na denúncia da PGR, no curso do devido processo legal, com garantia ampla do direito de defesa aos acusados”, escreveu a petista.

Analistas e políticos que cercam o Planalto levantam dúvidas quanto ao saldo, para Lula, de não ter Bolsonaro nas urnas em 2026. “O impacto [da abertura do processo] é mais positivo para Tarcísio do que para o presidente”, concluiu Karolina Roeder.

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