História da música “Águas de Março”, de Tom Jobim

Hoje é dia de conhecer a história de “Águas de Março”, um dos maiores clássicos do maestro Tom Jobim e da história da música popular brasileira.

A canção “Águas de Março” foi lançada inicialmente no compacto simples Disco de Bolso do jornal O Pasquim, O Tom de Antônio Carlos Jobim e o Tal de João Bosco”, que contava com a também primeira gravação da música “Agnus Sei”, de João Bosco e Aldir Blanc no lado B.

A seguir, Tom Jobim lançou “Águas de Março” em LP, no álbum “Matita Perê”, no ano seguinte. 

Em 1972, a cantoraElis Regina já tinha incluído a canção em seu álbum “Elis”, e – em 1974 – foi lançada a versão mais conhecida dessa música, que ganhou o Brasil e o mundo e até hoje é considerada uma das mais importantes gravações da MPB: o dueto entre Elis Regina e Tom Jobim, noantológico álbum “Elis & Tom, gravado em Los Angeles. 

O encontro das duas lendas da música brasileira ganhou o mundo e “Águas de Março” se tornou uma das 10 canções mais executadas no planeta no século XX. Em 2001, foi nomeada como a “melhor canção brasileira de todos os tempos” em uma pesquisa com mais de 250 jornalistas brasileiros, músicos e outros artistas do Brasil, conduzida pelo jornal Folha de São Paulo.

Em pesquisa similar, realizada pela edição brasileira da revista Rolling Stone, em 2009, a canção ocupa o segundo lugar, atrás de “Construção”, de Chico Buarque.

História da música “Águas de Março”

Depois do sucesso daBossa Novanos anos 60 – do qual Tom Jobim foi um fundadores e principais nomes, ao lado de João Gilberto e Vinicius de Moraes, principalmente depois da canção “Chega de Saudade”, sobre a qual já contamos a história aqui – o maestro dizia ter caído no esquecimento no início dos anos 70.

Tom Jobim se sentia deprimido, estava bebendo muito e reclamava sobre as pessoas não ouvirem mais suas músicas. Foi neste momento difícil que ele foi passar um tempo em seu sítio, localizado em Pedro do Rio, em Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro.

Foi neste sítio que Tom começou a criar “Águas de Março” a partir da música “Matita Perê”, que ele havia acabado de compor, junto com Paulo César Pinheiro, e canção que veio dar nome ao seu próximo disco, do qual fez parte “Águas de Março”. 

Inspirado também no poema “O Caçador de Esmeraldas”, do poeta Olavo Bilac, e um ponto de macumba de Raul e João Valença, chamado “Pisa Baiana”, que dizia assim: “É pau, é pedra, é seixo miúdo, pisa a baiana por cima de tudo”.

Foi em março, ao findar das chuvas, quase à entrada

Do outono, quando a terra, em sede requeimada,

Bebera longamente as águas da estação,

– Que, em bandeira, buscando esmeraldas e prata,

À frente dos peões filhos da rude mata,

Fernão Dias Pais Leme entrou pelo sertão.

O Caçador de Esmeraldas, Olavo Bilac

Em uma entrevista de 1986, para o programa “Persona”, do jornalista Roberto D’ávila pela TVE Brasil, Tom Jobim contou sobre a história da canção “Águas de Março”:

“É uma música muito simples, musicalmente muito singela mesmo. Eu escrevi em um papel de pão, aquele papel pardo. Fui escrevendo aquilo depressa aqueles objetos todos foram chegando na canção, uma coleção de vários itens (…). Eu estava construindo uma casa.”. Justamente a casa de Pedro do Rio. 

E tinha o nó da madeira, o pau, a pedra, as coisas básicas (…), tinha o rio, a conversa ribeira. E as águas de março interferem na construção da casa, porque idealmente você deveria construir a casa em agosto, um mês bem seco. esse negócio de você construir casa nas águas não é recomendável, porque tem barro, o caminhão não sobe na estrada.”.

A música faz outras referências ao momento de reforma da casa, a uma vida no mato, e da tristeza que rondava a vida de Tom, como:

“É o projeto da casa, É o corpo na cama

É o carro enguiçado, é a lama”

“É a viga, é o vão”

“É um estepe, é um prego”

“É o tijolo chegando”

“É um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã

É um resto de mato na luz da manhã”

É o fundo do poço, é o fim do caminho. 

No rosto um desgosto, é um pouco sozinho”.

Em 1973, Tom Jobim compôs uma versão em língua inglesa da canção, “Waters of March”, em que manteve a estrutura e foi muito fiel à letra, mantendo também a metáfora central do significado da letra. Só não deu para traduzir palavras que faziam referências específicas à cultura brasileira, como “festa da cumeeira”, “garrafa de cana” e Matita Pereira”. A música foi gravada por nomes como Al Jarreau e Sérgio Mendes.

Tom Jobim conta nessa mesma entrevista – da qual também participavam Miúcha, Tárik de Souza, Helena e Ana Jobim – que deu bastante trabalho traduzir a letra, exatamente por conta dessas palavras, mas que ele usou bastante o dicionário de inglês-português para isso.

É engraçado que ele, lá em 1986, prevê aquilo que depois veio a ser o “Google Tradutor” e outras ferramentas online de tradução tão acessíveis à nossa época de hoje: “Eu queria te um computador – isso já deve existir na américa há muitos anos – em que você escrevesse uma palavra no teclado e ela aparece traduzida em cinco línguas na hora!”.

Ele também conta que uma coisa curiosa foi o fato de os norte-americanos terem compreendido totalmente o sentido da música, mesmo março não sendo um mês de chuvas que fecham o verão para eles:

No hemisfério norte as águas de março são as águas do degelo, quando termina o inverno e se aproxima a primavera. Os rios que estavam parados, congelados, começam a andar e as serras que estavam congeladas começam a soltar as avalanches, engrossando os rios.”. Então também faz sentido pra eles, mesmo sendo diferente do sentido que faz pra nós.

O sucesso imenso que fez a música, trouxe para Tom Jobim um novo começo, alçando seu nome ainda mais longe. Ele, que começou cantando sobre pau, pedra e fim do caminho, terminou com as águas de março trazendo uma nova fase, com promessas de vida no seu coração!

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