Receita Federal passa a monitorar transações acima de R$ 5 mil; o que muda?

Neste ano, a Receita Federal começou a exigir que operadoras de cartão de crédito e instituições de pagamento informem transações financeiras superiores a R$ 5 mil realizadas por pessoas físicas e R$ 15 mil mensais no caso de pessoas jurídicas. A medida, publicada em setembro do ano passado, e que entra em vigor neste ano, tem como objetivo intensificar o controle sobre operações financeiras e combater práticas como evasão fiscal e sonegação de impostos.

Com isso, não apenas transferências únicas que ultrapassem R$ 5 mil serão monitoradas. Operações acumuladas que superem esse valor, como transferências via Pix realizadas de forma fragmentada, também serão informadas à Receita Federal.

Na tarde de ontem, a Receita Federal negou que serão criados tributos sobre o uso do Pix, devido a algumas notícias falsas que circularam nas redes sociais. De acordo com a instituição, a medida visa um melhor gerenciamento de riscos pela administração tributária, ainda, segundo o órgão, “isso será oferecido respeitando às normas legais dos sigilos bancários e fiscal”.   

Abaixo, Jorge Martinez, empresário contábil parceiro da Omie, plataforma de gestão (ERP) na nuvem, e sócio da HB Realiza, oferece respostas às principais dúvidas dos consumidores sobre a nova medida. Confira!

Consumidor Moderno: O que acontece se não declarar uma transferência financeira que deveria ser informada? Quais são as decisões ou consequências legais por omissões, ou erros na declaração?

Jorge Martinez: Não declarar transferências financeiras no Imposto de Renda pode levar à malha fina, quando a Receita Federal identifica inconsistências e o contribuinte pode ser convocado para corrigir ou justificar a omissão. Se for constatada a sonegação, pode ser aplicada uma multa de até 75% sobre o valor não declarado, além de juros sobre a correção monetária. Em casos mais graves, quando há dolo, ou seja, quando existe intenção de ocultar, a pessoa pode ser investigada por crime fiscal.

Monitoramento detalhado e cruzamento de dados

CM: Como a Receita Federal monitora transações financeiras e identifica inconsistências? Isso inclui apenas transferências bancárias ou também transações realizadas em carteiras digitais, fintechs e aplicativos de pagamento?

A Receita Federal monitora transações financeiras por meio do cruzamento de dados fornecidos por cada participante das movimentações e compara o valor declarado com os que constam nas instituições financeiras, nos bancos, aplicativo de pagamento, fintechs, cartórios, e, por fim, na declaração de imposto de renda da Pessoa Física. 

Valores de compra, venda, empréstimos, dívidas e rendimentos precisam ser expressados corretamente até nos centavos. Quando uma informação diverge, significa que uma das partes errou ou está omitindo algo, sonegando, e fica sujeito à malha fiscal. 

Esse controle abrange transferências bancárias (depósitos, TED, DOC e cheques descontados), pagamentos realizados por carteiras digitais, movimentações em fintechs, operações com criptomoedas, e, a partir desse ano de 2025, transferências por Pix.

CM: Como funciona o cruzamento de dados pela Receita Federal? A Receita compara informações de outras instituições, como bancos, corretoras ou até mesmo cartórios?

O cruzamento de dados pela Receita Federal ocorre automaticamente, comparando as informações recebidas de diversas fontes, como bancos, corretoras, cartórios e empresas. Por exemplo, a compra e venda de imóveis é registrada em cartórios, que reportam essas informações à Receita. Da mesma forma, bancos e corretoras informam rendimentos, saldos e transações financeiras. Caso haja divergência nos valores entre a declaração do contribuinte e os dados fornecidos por essas instituições, a Receita identifica a inconsistência e pode solicitar esclarecimentos ou aplicar penalidades.

CM: Existem transações que precisam ser declaradas, mas não geram imposto a pagar? Exemplos como doações entre familiares, venda de bens abaixo do valor de aquisição ou transferências entre contas do mesmo titular.

Sim, existem transações que precisam ser declaradas, mesmo sem gerar imposto a pagar, uma vez que o Imposto de Renda deve conter todo e qualquer bem, rendimento, dívida, empréstimo e ganho que ocorreu dentro do ano relacionado, como:

  • Doações entre familiares, que devem ser informadas pelo doador e pelo recebedor;
  • Venda de bens abaixo do valor de aquisição, que, mesmo sem ter ganho de capital, devem ser registradas para acompanhamento;
  • Transferências entre contas do mesmo titular, que são isentas, mas devem ser declaradas para justificar a origem dos recursos e evitar inconsistências.

Isso ajuda a manter a transparência do patrimônio e a evitar problemas com a Receita.

Atenção redobrada com moeda estrangeira e criptomoedas

CM: Como declarar movimentações financeiras realizadas em moeda estrangeira? Há diferenças para quem realiza operações em dólar, euro ou criptomoedas em exchanges internacionais?

Movimentações financeiras em moeda estrangeira devem ser convertidas para reais usando a cotação oficial do Banco Central na data da operação. Tem que entender se houve rendimento em moeda estrangeira ou apenas ganho de capital para converter, mas também é possível declarar diretamente em moeda estrangeira ou cripto.

Na ficha “Bens e Direitos”, é possível declarar os saldos em moeda estrangeira e declarar rendimentos ou ganhos de capital (se houver) na ficha correspondente. O mesmo vale pra criptomoedas, mas deve informar o tipo (Bitcoin, Ethereum, etc.) e a exchange utilizada. Ganhos com a venda de criptomoedas devem ser apurados mensalmente e informados em caso de lucro superior a R$ 35.000 no mês.

As regras podem variar conforme o tipo de ativo, mas o princípio geral é a conversão adequada e o detalhamento preciso para evitar inconsistências.

CM: Quais são os principais erros que os contribuintes cometem ao declarar movimentações financeiras? Como evitar problemas comuns, como divergências de valores ou omissões acidentais?

É preciso mostrar com exatidão todos os valores de rendimentos e investimentos do ano e ter total atenção na hora de transmiti-los por meio do programa da declaração de ajuste anual do Imposto de Renda (IR), disponibilizado pela Receita Federal (RF). Um simples erro de digitação poderá levar o contribuinte diretamente à malha fina.

Também é fundamental ficar muito atento aos comprovantes e se a transação também foi declarada com exatidão pela fonte pagadora, o prestador de serviço ou o tomador de serviço. Em alguns casos, pode acontecer de uma pessoa cair na malha fina por ter informado corretamente, mas a outra parte não ter feito o mesmo.

Além disso, é necessário tomar cuidado e sempre guardar toda a documentação durante 5 anos, em caso de necessidade de comprovação por exigência da RF.

Transações envolvendo variação patrimonial incompatível com a renda também é um erro facilmente identificado pela Receita e pode acontecer por falta de atenção. Se no mesmo ano em que a pessoa recebeu R$100 mil, comprou um imóvel por R$300 mil à vista, por exemplo, sem nenhuma outra fonte de renda, a Receita pode entender que alguma renda foi omitida. Na prática, os gastos devem ser compatíveis com a renda declarada.

Isso pode acontecer se a pessoa informar o valor total do imóvel ou veículo, por exemplo, quando na verdade deu apenas uma entrada de R$20 mil e parcelou o restante. Nesse caso, ela deve informar apenas o valor de entrada mais a soma das parcelas pagas no ano referente à declaração, justamente para evitar a malha fina.

Inclusive, é importante ter atenção à correção do imóvel a valor de mercado. Se uma casa foi comprada em 2001 por R$100 mil e hoje ela vale R$300 mil, o valor não deve ser atualizado. O contribuinte deve corrigir o valor apenas em situações muito específicas, como no caso de uma reforma, por exemplo. Caso contrário, é preciso repetir sempre o valor da aquisição.

CM: E no caso de declarações sobre pensão alimentícia e planos de previdência, quais são os cuidados recomendados?

Um erro comum é a declaração das transações de valores de pensão alimentícia. Se o contribuinte paga pensão alimentícia, seu beneficiário é alimentado e não dependente. Se trocar os papéis na declaração, vai cair na malha fina e pode pagar multa.

Muitas pessoas também confundem o plano de previdência do tipo VGBL, que não permite abatimento, com o PGBL, cujas contribuições podem ser deduzidas da base tributável do IR, até o limite de 12% da renda. O PGBL deve ser informado em “Pagamentos Efetuados”. Já o VGBL deve ser declarado como uma aplicação financeira e seu saldo é informado na ficha “Bens e Direitos”. Além disso, muitos resgatam os valores de previdência privada, mas se esquecem de declará-los.

Se o contribuinte optar pela tabela progressiva (quanto maior a renda, maior o imposto) e, ao fazer o resgate, esquecer de declarar ou não informar o valor na ficha de “Rendimentos Tributáveis’, pode deixar de pagar imposto e cair na malha fina, sendo chamado para pagar o que está faltando. Já na tributação regressiva (quanto maior o tempo, menor o imposto), o IR é totalmente recolhido na fonte, então não altera o resultado da declaração, mas se a pessoa não declarar também causa inconsistência.

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