Nosferatu, o ícone gótico

Tom Leão

‘Bela Lugosi´s dead’, como canta o Bauhaus? Pelo visto, não. O novo “Nosferatu”, de Robert Eggers, um dos expoentes do horror moderno, está fazendo bonito nos cinemas mundo afora. Até agora, é o maior sucesso comercial do diretor americano, que já nos deu ótimos (e bizarros) filmes como “A Bruxa” (meu favorito), “O Farol” e “O Homem do Norte”. Merecido.

Contudo,  comparado com o original (mudo) de 1922, de Murnau (um dos clássicos do cinema expressionista alemão), e com a versão falada (e colorida) de 1979, de Herzog (com Isabelle Adjani e Klaus Kinski), o novo Nosferatu difere apenas por ser sexualmente mais explícito e por ter algumas cenas mais escabrosas. A qualidade visual é do mesmo nivel dos filmes anteriores do diretor; e o desenho de som, é muito bom.

Foram 102 anos entre o primeiro e o atual (e mais de 10 anos até que Eggers conseguissse realizar o seu). O primeiro “Nosferatu”, lançado em 1922, é um clássico do cinema mudo dirigido por F.W. Murnau (que fez outros filmes mudos maravilhosos, como “Aurora” e “Tabu”). O filme, é uma adaptação não autorizada do romance “Drácula”, de Bram Stoker (filmada, oficialmente, pela Universal Pictures, com Bela Lugosi, em 1931), o que resultou em uma longa disputa judicial e na ordem para destruir todas as cópias do filme. Felizmente, algumas cópias sobreviveram em cinematecas ao redor do planeta, e “Nosferatu”, revivido, tornou-se um marco do cinema mundial.

 A versão restaurada definitiva, de 2007, costuma ser exibida com a trilha original, com acompanhamento de piano — como era, em sua época. Já vi, uma vez, assim, no Theatro Municipal do RJ. O filme é notável por sua atmosfera sombria e inquietante (a trilha ajuda bastante nisso), bem como pela atuação marcante de Max Schreck como o vampiro Conde Orlok (assim como Frankenstein é o cientista, não o monstro, Nosferatu não é o nome do vampiro, mas um termo em latim para designar morto-vivo). Não à tôa, se tornou um ícone do movimento dark, utilizado por várias bandas goth inglesas.

O “Nosferatu” de 1922 tem uma bela estética visual, utilizando sombras e luzes de maneira quase natural, para criar um senso de terror e suspense (vemos o vampiro mais através de sombras do que em pessoa). As locações escolhidas, incluindo o castelo do Conde Orlok (numa região da República Tcheca, usado tanto no filme de Herzog quanto no atual), contribuem para o clima assustador. A maquiagem e o figurino de Max Schreck criam uma imagem do vampiro diferente dos retratos mais glamurosos e aristocráticos de outras adaptações de “Drácula”, tornando o personagem mais aterrorizante. Na época, diziam que Max encarnou tão bem o papel que se achava o próprio vampiro, como visto em “À Sombra do Vampiro” (2000).

Lily-Rose Depp em cena do novo filme | Fotos: Divulgação

Em 1979, Werner Herzog dirigiu um remake intitulado “Nosferatu: Phantom der Nacht” (‘O Vampiro da Noite’). Este foi uma homenagem ao original de Murnau e teve Klaus Kinski como o Conde Drácula, nome utilizado nesta versão devido aos direitos autorais já terem expirado. Assim, os personagens no filme de Herzog usam os mesmos nomes dos apresentados no livro de Stoker (Ellen, vira Lucy). Herzog manteve muitos elementos visuais e narrativos do filme de 1922, mas adicionou sua própria visão, trazendo uma profundidade psicológica maior aos personagens.

A interpretação de Klaus Kinski como Drácula é ótima. Isabelle Adjani está muito bem como Lucy (e Lily-Rose Depp, filha de Johnny, está no mesmo nível, no atual, usando o nome do original, Ellen/Leni). O filme de Herzog é também reconhecido por sua trilha sonora, a cargo da banda progressiva alemã Popol Vuh (1969-2001), que foi bastante copiada.  A versão atual (cujo score, é de Robin Carolan, o mesmo de ‘The Northman’), difere das anteriores, por mostrar um Orlok mais forte e de bigode (comum entre os homens da época). Embora esta seja a primeira versão não-alemã, e com atores majoritariamente não-europeus, o morto-vivo de Eggers fala em seu dialeto (uma espécie de romeno antigo) e todos os aspectos do original foram mantidos. E, como em nenhum outro, ele chega às vias de fato com sua paixão feminina. O “Nosferatu” de Eggers é uma bela peça de horror gótico, feita no capricho, e que deve ser apreciada no cinema. Terá uma versão com três horas de duração, quando sair em blu-ray.

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