Profundamente feminino em suas angústias,”Emilia Pérez” quebra paradigmas narrativos

Diretor Jacques Audiard e a estrela do filme, Karla Sofía Gascón, vêm ao Brasil para divulgar o longa vencedor do Globo de Ouro e principal favorito ao Oscar. Eles estarão em São Paulo entre 20 e 22 de janeiro e “Emilia Perez” estreia nos cinemas em 6 de fevereiro

Redação Culturize-se

As atrizes de Emília Pérez
Foto: Netflix Queue

Em “Emilia Pérez”, Karla Sofía Gascón entrega uma performance transformadora como Juan “Manitas” Del Monte, um chefão do cartel cuja trajetória de violência é substituída por uma jornada profundamente emocional rumo a se tornar a personagem-título, Emilia. O papel é extraordinário não apenas por seu arco narrativo, mas também pelas exigências colocadas sobre Gascón para interpretar uma personagem complexa, que encarna uma transição física, emocional e moral. Dirigido por Jacques Audiard, este musical dramático policial desafiador de gêneros é tão multifacetado quanto sua protagonista, explorando temas como identidade, redenção e autodescoberta.

O filme, coestrelado por Zoe Saldaña, Selena Gomez e Adriana Paz, conquistou tanto o público quanto a crítica, recebendo reconhecimento coletivo no Festival de Cannes, onde Gascón se tornou a primeira atriz trans a ganhar o prestigioso prêmio de Melhor Atriz. Ela pode, ainda, tornar-se a primeira a concorrer ao prêmio de Melhor Atriz no Oscar. Emilia Pérez” não é apenas a história de uma mulher; é uma meditação profunda sobre a possibilidade de reinvenção e os desafios de reconciliar o passado com o presente.

Adaptado livremente de um capítulo do romance “Écoute”, de Boris Razon, de 2018, o filme reimagina a história de um traficante de drogas que transita para uma nova vida. Audiard, junto aos roteiristas Thomas Bidegain, Nicolas Livecchi e Léa Mysius, constrói a narrativa alternando entre a brutal realidade da violência do cartel e a ternura de uma metamorfose profundamente pessoal.

A Emilia de Gascón não é simplesmente uma personagem fugindo da justiça ou buscando refúgio em uma nova identidade. Ela é uma mulher tentando expiar os horrores de seu passado ao fundar uma organização sem fins lucrativos para localizar os restos mortais das vítimas da violência do cartel. Essa dualidade — uma pessoa assombrada por sua história, mas lutando por redenção — ancora o núcleo emocional do filme.

Gascón insistiu que as motivações de Emilia fossem claras, destacando a importância de uma representação autêntica. “Teria sido uma piada se não tornássemos suas motivações explícitas,” disse Gascón em entrevistas. Seu compromisso transparece em cada cena, com a evolução da personagem capturada em uma performance cheia de nuances que alternam entre vulnerabilidade e determinação.

O filme prospera graças ao seu elenco, cujas atuações elevam as apostas emocionais da narrativa. Zoe Saldaña interpreta Rita, uma advogada brilhante, porém subestimada, que ajuda Emilia a organizar sua transição e encontra empoderamento no processo. A interpretação de Saldaña reflete sua conexão com suas raízes como dançarina clássica. Sua rigorosa preparação, incluindo sessões intensivas de coreografia com Damien Jalet, adiciona uma dimensão física ao crescimento de Rita. “Foi revigorante,” disse Saldaña, descrevendo a experiência como um retorno à arte cênica de sua juventude.

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Selena Gomez, como Jessi, esposa de Emilia, também entrega uma atuação marcante, interpretando uma personagem que incorpora as dualidades de ser mexicana-americana. Gomez abraçou o desafio de atuar predominantemente em espanhol, o que a tirou de sua zona de conforto, mas enriqueceu sua conexão com o papel. “Jessi é uma personagem que raramente vemos representada,” refletiu Gomez, destacando como o filme celebra as complexidades da identidade.

Adriana Paz adiciona mais profundidade, interpretando Epifanía, uma personagem que cruza o caminho de Emilia em um momento crucial. Juntas, o elenco forma uma irmandade cinematográfica, tanto dentro quanto fora das telas, exaltando o poder transformador da narrativa.

Uma odisseia musical

Central para “Emilia Pérez” está sua identidade como musical, com composições originais dos franceses Clément Ducol e Camille. A coreografia do filme, uma fusão de movimentos explosivos e ressonância emocional, complementa visceralmente a narrativa. Gascón, que admite não ser cantora profissional, enfrentou o desafio de interpretar canções em dois registros vocais distintos para refletir a dualidade de sua personagem. “Foi um desafio para mim porque não sou cantora,” explicou, mas ela abraçou as exigências como uma extensão de sua arte.

“Emilia Pérez” desafia categorizações tradicionais. É um musical, um drama policial, uma comédia e uma narrativa inspirada em telenovelas, tudo ao mesmo tempo. A direção de Audiard abraça essa fluidez, criando um filme que celebra a quebra de convenções. O próprio diretor descreve o projeto como uma evolução da narrativa: “Não acho que devamos tentar defini-lo mais por gênero.”

O compromisso do filme com a autenticidade e a inovação também se reflete em sua exploração temática de identidade. Ele não evita as complexidades da transição, optando por mergulhar profundamente nas camadas interseccionais de transformação pessoal e social.

Os prêmios para “Emilia Pérez” destacam sua importância cultural. A vitória em Cannes marcou um momento histórico para Gascón e a indústria cinematográfica. Seu discurso de aceitação, carregado de emoção, abordou as lutas e triunfos da comunidade trans. “Todos nós temos a oportunidade de mudar para melhor,” declarou no palco principal do evento.

“Emilia Pérez” é um testemunho do poder da arte de desafiar, provocar e inspirar. Reunindo um diretor visionário, um elenco destemido e uma narrativa inovadora, o filme transcende a tela. Para Gascón, a experiência foi transformadora, tanto profissional quanto pessoalmente. “Este é o melhor trabalho que já fiz na minha vida,” admitiu, um sentimento compartilhado por públicos e críticos cativados por sua jornada extraordinária.

À medida que o filme alcança públicos mais amplos por meio de plataformas de streaming como a Netflix, onde o filme foi distribuído nos EUA, seu impacto promete crescer. Afinal, “Emilia Pérez” é uma celebração de resiliência, arte e do espírito humano indomável. Tudo que o Oscar, que deve expandir o alcance do longa, adora.

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